Era uma vez uma menina que tinha um pássaro.
Ele era um pássaro diferente de todos os demais: era encantado.
Os pássaros comuns, se a porta da gaiola ficar aberta, vão-se embora para nunca mais voltar. Mas o pássaro da menina voava livre e vinha quando sentia saudades. A menina amava aquele pássaro e podia ouvi-lo sem parar, dia após dia. E o pássaro amava a menina, e por isto voltava sempre. Mas chegava a hora da tristeza.
— Tenho de ir (passaro)
— Por favor, não vás. Fico tão triste. Terei saudades. E vou chorar (menina)
— Eu também terei saudades. Eu também vou chorar. Mas vou contar-te um segredo: as plantas precisam da água, nós precisamos do ar, os peixes precisam dos rios... E o meu encanto precisa da saudade. É aquela tristeza, na espera do regresso, que faz com que as minhas penas fiquem bonitas. Se eu não for, não haverá saudade. Eu deixarei de ser um pássaro encantado. E tu deixarás de me amar (pássaro)
Assim, ele partiu. A menina, sozinha, chorava à noite de tristeza, imaginando se o pássaro voltaria. E foi numa dessas noites que ela teve uma ideia: “Se eu o prender numa gaiola, ele nunca mais partirá. Será meu para sempre. Não mais terei saudades. E ficarei feliz...”. Comprou uma linda gaiola, de prata, própria para um pássaro que se ama muito. E ficou à espera. Ele chegou finalmente. Cansado da viagem, adormeceu. Foi então que a menina, cuidadosamente, para que ele não acordasse, o prendeu na gaiola, para que ele nunca mais a abandonasse. E adormeceu feliz.
Ah! menina… O que é que fizeste?
Sem a saudade, o amor ir-se-á embora(pássaro)
E veio o silêncio: deixou de cantar...
Também a menina se entristeceu. Não, aquele não era o pássaro que ela amava. E de noite ela chorava, pensando naquilo que havia feito... Até que não aguentou mais e
abriu a porta da gaiola.
— Podes ir, pássaro. Volta quando quiseres (menina)
— Obrigado, menina. Tenho de partir. E preciso de partir para que a saudade chegue e eu tenha vontade de voltar. Longe, na saudade, muitas coisas boas começam a crescer dentro de nós. Sempre que ficares com saudade, eu ficarei mais bonito. Sempre que eu ficar com saudade, tu ficarás mais bonita. E enfeitar-te-ás, para me esperar (pássaro)
E partiu. Voou que voou, para lugares distantes. A menina contava os dias, e a cada dia que passava a saudade crescia.
— Que bom (pensava ela)
— o meu pássaro está a ficar encantado de novo...
E ela ia ao guarda-roupa, escolher os vestidos, e penteava os cabelos e colocava uma flor na jarra.
— Nunca se sabe. Pode ser que ele volte hoje(menina)
Sem que ela se apercebesse, o mundo inteiro foi ficando encantado, como o pássaro. Porque ele deveria estar a voar de qualquer lado e de qualquer lado haveria de voltar. Mundo maravilhoso, que guarda em algum lugar secreto o pássaro encantado que se ama...
E foi assim que ela, cada noite, ia para a cama, triste de saudade, mas feliz com o pensamento: “Quem sabe se ele voltará amanhã...”
E assim dormia e sonhava com a alegria do reencontro.
"Quando duas pessoas que se amam têm de dizer adeus... Depois do adeus, fica aquele vazio imenso: a saudade. Tudo se enche com a presença de uma ausência. Como seria bom se não houvesse despedidas... Alguns chegam a pensar em trancar em gaiolas aqueles a quem amam. Para que sejam deles, para sempre... Para que não haja mais partidas... Poucos sabem, entretanto, que é a saudade que torna encantadas as pessoas. A saudade faz crescer o desejo, e quando o desejo cresce, preparam-se os abraços..."
Com um beijo de saudade...Niki*